Carta Náutica dAILHA - RITOS DE ENTRADA





O convite veio um tanto quanto inesperado, exatamente no dia 18/09/2012. 
Ele disse que havia um roteiro seu que gostaria que eu visse. Para ser mais exata, o texto veio assim:

"Rosi, me passa teu Email .. tenho uma proposta de cinema pra fazer pra você... te interessa?". 
Ao que respondi: Bora, ver do que se trata né?!rr- repassando de imediato o endereço.

Ao receber o aguardado, li, sem rodeios, algo que dizia: 


"Ai Rosi, segue o argumento e o 2º tratamento do roteiro (pretendo trabalhar bastante o roteiro até a filmagem, principalmente falas, e no monólogo da personagem que te convido pra fazer: Silene). A idéia é trabalhar com atores-criadores mesmo.



O filme vai ser rodado na ilha de Cotijuba, estou indo morar p lá semana que vem... pretendo morar até dezembro... a ideia é terminar esse filme nesses 3 meses (outubro/novembro/dezembro). Eu vou já pra ir pesquisando locações, trabalhando com não-atores de lá, estudando luz, produzindo com a direção de arte, etc... Essa semana quero fechar a equipe e o elenco todo  e pensar num cronograma executivo a partir da disponibilidade do grupo. A produção é independente, no esquema experimental que tu já conhece no teatro, mas tem o apoio lá na produção de uma galera da Escola Bosque, um pessoal bem bacana.




é isso... espero tua resposta. Bjos."




Apreciei os textos no mesmo dia, roteiro e argumento estavam lá. 

Não exitei disparando às 23h06':  "Gostei do argumento. Roteiro aprovado". Me liga. Rose

Daí marcamos um encontro para olhar juntos alguns novos ajustes no texto inicial e apurar outras idéias. Já ali descobrimos curiosidades importantes do tipo com o que trabalhávamos e que nossos interesses giravam em torno de alguns temas afins. Bom indutivo pra começar a conversar. Ele trouxe uma cronograma de atividades, tudo ficou acertado e, assim,  decidimos começar.
Estive na ilha de Cotijuba, já conhecida pra mim de longa data, ainda no mês de outubro para o que seria, talvez,  um primeiro exercício o que não se concretizou pela característica de dia preguiçoso em família.

Sobre o primeiro dia em nos conhecemos e que estivemos reunidos eu, Mateus, Rodolfo, Raquel, Carline, Sid e Ana Karina, escrevi:

" O dia foi meigo, brejeiro, de uma delicadeza reconhecidamente familiar. O almoço u, "lírio mimoso", as pessoas simpáticas e simples do jeito que aprecio... e o rio, ah, o rio!, avassalador e melodioso em sua sedução milenar. Há muito não vivia um sábado tão gostoso, leve, BOM. rr [...]". Almoço, descanso, retorno... 







EXERCÍCIO Nº 1

[...] O rio nunca pareceu tão favorável. Dia claro, calmo, de uma lentidão aguda e aparentemente despretenciosa. Sentia algo como que estranho no ar. Uma estranheza de certa forma íntima e comungada. O sono e o despertar precisos nos prepararam para o entardecer. Desvendamos trilhas, ora calçados, ora com os pés no chão, na areia quente de "ainda agora a pouco o sol estava aqui". Fomos ao igarapé e o Gabriela não era mais o mesmo, dava sinais de modificado e, por isso, cansado... uma ponte o emoldurou com plano de fundo desconhecido sem requinte de ternura. Areia, piçarra, casas, ponte, casas, caminho fechado, casas, ponte abrindo a floresta pro rio. Caminho ondulado do mato ladeado de olhos d'água a deitar-se na praia mais à frente. Caminho pra fora de nós (?!) cada vez mais pra dentro da ILHA. Conversamos contemplados pelo sol que desaparecia com esmero, apreciando cada detalhe daquela conversa de "velhos conhecidos". Paisagens-textos subliminares triangulavam confidências de ambas as partes. Ante a nossa perplexidade diante de tantas coincidências, o rio nos requisitava  um mergulho pra saldar o dia-talvez! ou a chegada da noite rainha que despontava sorrateira por entre as folhagens secas daquele dia excessivamente quente de sol. As ondas nos empurravam cada vez mais pra lá, cada vez mais pra cá, para os 'eus' que estávamos a descobrir em busca do 'nós artístico' de logo mais adiante. E assim escureceu. Banhamo-nos em águas novas! Fomos presenteados pelo banho morno, infante e brincalhão com ares de primeira vez. Momento soturno, difuso foi aquele em que uma outra paisagem-renda cobriu o céu com seus detalhes multicores trazendo a lua desfocada no alto céu pra testemunhar o encontro. O cemitério nunca esteve tão poético e desejável. Trilhas, atalhos, sussuros e mais risos soltos entre as bobagens que solicitavam intromissão em nossa conversa adulta. Aqui e ali um gracejo de pé esbarrando a terra barrenta que teimava voltar pra casa conosco.

" Eu tenho medo dos vivos!" -esnobava ela-; "Eu já fiquei no sítio sozinho!" -impiedoso, ele não deixava por menos! À chegada, em frente a casa de esquina, o porco preto e o gato já citados, vagavam com reconhecida presença não motivada - presença quase cênica, eu arriscaria!. O exercício-laboratório na rua: Silene, à caça, nasce. Aparecimento/ desaparecimento súbito e breve o suficiente para arregalar os olhos claros do rapaz. Notícia de que traços da persona começavam a dar sinais de existência. O banho de cabeça preparado com ervas de lá. " As batatas da janta se foram com a água quente!" (ai! eu não sabia!- penaliza-se a atriz ao seu diretor...). E ele a tudo observa. Tudo tão simples e tão longo...tão cadenciado pelo tempo da cumplicidade que nem sei como explicar. O olhar, o cheiro, o cenário traria de novo o vazio. Jantamos. Outra sessão de diálogos de margem e correnteza. Caiu a noite pesada. A casa amarela dormiu e eu, que há muito não sovanha, naquela noite, sonhei três vezes. Esse foi o primeiro dia.[...]

.......









Rosilene Cordeiro






















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