A cena artística em movi (anda) mento: "Corpo, teatro e travestismo atravessando a cena contemporânea

"Eu sou um intelectual que não tem medo de ser amoroso,
eu amo as gentes e amo o mundo.
E é porque amo as pessoas e amo o mundo,
que eu brigo para que a justiça social se implante antes da caridade."
(Paulo Freire, educador, ativista político, sonhador...)

1. Corpo cena e cenário... contextos de onde a pesquisa surge

Paralelo ao meu processo de formação acadêmica no âmbito da pós-graduação em Estudos Contemporâneos do Corpo (ICA/ UFPA), continuo a ralizar trabalhos artísticos que me provocam a investigar diferentes qualidades corporais em contextos diferenciados e em tempos distintos de criação/ transmissão/ recepção em Teatro. Apesar de já ter realizado alguns trabalhos voltados ao cinema, continuo sendo/ sentindo-me, uma artista da cena teatral que tanto quanto pode, experimenta/ aventura-se, lança seu corpomídia em poéticas híbridas, inquietantes e atuais, muitas vezes desconfortáveis e tensas socialmente falando, o que me permite aprofundar o olhar sobre a construção do meu corpo-performer a partir da práxis-reflexiva que perpassa cada novo trabalho proposto.
A pesquisa realizada e apresentada no Auto do Círio deste ano em torno da Arte do Travestismo, vem do fato de, como educadora ter presenciado no dia-a-dia das escolas, ao longo destes 19 anos dedicados à educação, ora como professora, ora como orientadora educacional, tanto na escola pública como na rede particular de ensino (reduto maior da minha atuação desde o início da carreira!), processos extremos de discriminação sexual entre crianças, adolescentes e jovens, e mesmo adultos, que tendo uma orientação sexual que foge aos ditames sociais vigentes, sedimentada num discurso heteroxessual unilateral e classista; pregado por uma sociedade individualista, rotuladora e excludente, tem segregado pessoas indistintamente, sem considerar os direitos individuais de expressão dos sujeitos, inclusive no que tange a sua sexualidade, desconsiderando-os desqualificando-os em seu potencial humano, social, cultural, sensível, religioso e criativo, o que precisa ser reparado, ao meu ver, de forma emergencial.
As agências formadoras, principalmente família e escola, precisam garantir a esses cidadãos o acesso imediato ao que lhes é de direito: a legitimação de sua dignidade humana, da sua sensibilidade, da afetividade e o direito a um tratamento igual na diversidade em que se sentem e se manifestam, com respeito necessário e incondicional, sem o qual o diálogo acolhedor da diversidade não consegue se estabelecer, e portanto a sociedade plural algo cada vez mais distante de ser alcançado.
Basta de escolas omissas e professores pseudo-alheios a homossexualidade que transita ainda tida como marginal entre nós!
Chega de crianças e jovens sofrendo retaliações de colegas pouco esclarecidos acerca da sua própria sexualidade e, portanto da do outro que divide conosco a cena social e humana da vida.
A orientação em torno da sexualidade praticada ainda em muitas instituições de ensino tem negado aos indivíduos um reconhecimento, um valor ético, fruto de um sistema educacional que lhes tira uma educação voltada ao exercício da diferença sem indiferença. Sexualidade AQUI ENTENDIDA para além dos discursos higienistas, biológicos e religiosos.
Esse trabalho não pretende fazer apologia a qualquer tipo de conduta ou códigos de postura sexual. Antes, deseja ser uma sinalização, por meio do corpo que se "tras/re/per veste" para sentir/acolher/experimentar em si as dores/sabores de uma corporeidade que como tantas outras quer e precisa expressar-se, manifestar-se em plenitude em busca da realização que todos almejam, do algo mais que talvez desconheçamos mas que está cada vez mais presente no dia-a-dia de todas as escolas do mundo inteiro, realidade de tantas famílias que necessitam de amparo, retaguarda de informações com que possam lidar com essa situação compreendendo o ser humano em sua totalidade e não apenas uma camada que o constitui como ser.
ABAIXO A HOMOFOBIA!!! Mudança social se constrói com gentes esclarecidas de seu papel no mundo. Para Paulo Freire conhecer é tarefa de sujeitos, não de objetos. E é como sujeito e somente enquanto sujeito, que o homem pode realmente conhecer. E é conhecendo seu lugar transformador e exercendo sua ação transformadora no mundo das idéias e das práticas sociais, que os sujeitos vivenciarão sua maior vocação: a inclinação à vida em plenitude, à realização pessoal e social a qual todos buscamos durante toda nossa existência, na qual equidade, justiça, direitos, respeito, tolerância e solidariedade convivem de forma harmoniosa, assegurando a cada um e a cada uma o que lhe é de merecido.

(Artigo por concluir...)

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