Miguel Santa Brígida, uma persona pra ver e guardar...

O Auto do Círio é arte, fé e devoção

Edição de 28/09/2008

Jornalista, ator, produtor, pesquisador, carnavalesco e professor de teatro. Miguel Santa Brígida, mestre e doutor em artes cênicas, possui inúmeros trabalhos desenvolvidos em prol do teatro paraense em quase trinta anos de profissão. Desde 1996 dirige o espetáculo Auto do Círio, apresentado desde 1993, sempre na sexta-feira imediatamente anterior à procissão do Círio de Nazaré, quando percorre as ruas da Cidade Velha. E sobre este grande evento, que já é tradicional no mês de outubro, que ele fala a seguir

Por Iva Muniz

Fotos GQ Estúdio

Troppo - Para quem nunca viu, como você resumiria o Auto do Círio?

Miguel - É um cortejo dramático popular, com o traçado sensível, diverso e múltiplo de ser paraense culturalmente. É uma procissão cênica carnavalesca a céu aberto com a miscigenação encantada da arte, da fé, da devoção e do espírito festivo do brasileiro. A estrutura dramática revive os autos medievais com estações nas igrejas históricas do centro histórico de Belém. Público e artistas comungam as diversas linguagens produzidas na UFPA, irmanadas com o carnaval, o folclore entre outras manifestações.

Troppo - Qual seu maior desafio à frente desse espetáculo?

Miguel - Garantir financeiramente sua viabilização, pois é um evento hiperbólico com 500 artistas, público superior a 10 mil espectadores, quatro palcos suspensos, arquibancada para três mil lugares, dois carros-som, além da estrutura de luz, efeitos de pirotecnia, etc. Nem sempre temos a garantia destas parcerias, pois, com o crescimento do evento, a UFPA precisa de uma ação conjunta dos órgãos oficiais que respondem pela cultura. Coordeno uma equipe de quase cem técnicos que trabalham por adesão, bem como todos os artistas locais e nacionais. Eles não recebem cachê. Atuam pelo compromisso com a importância do espetáculo.

Troppo - O que você e sua equipe estão fazendo para mudar esse quadro?

Miguel - Estamos tentando que os órgãos oficiais, tanto estadual quanto municipal, se juntem com a UFPA, como aconteceu pela primeira vez no ano passado, pois, em 2006 o espetáculo não aconteceu por falta desta parceria, e foi um vazio muito grande. Em 2007 voltou triunfalmente às ruas. O espetáculo tem uma consagração popular comovente, já faz parte do imaginário do Círio e do afeto e emoção comungada como uma grande tradição na cidade. Aliás, foi esse o motivo do espetáculo ter sido registrado em 2004 pelo IPHAN como Bem Imaterial atrelado ao Ciclo do Círio de Nazaré. Este foi um selo que deu muito orgulho para a UFPA, pois tivemos a certeza da projeção e importância do evento como referencia nacional. É uma ação extencionista da Escola de Teatro e Dança, que consolida a academia de mãos dadas com o povo e é recebida nos braços da multidão.

Troppo - Em que aspectos o espetáculo mostra amadurecimento e ganhos ao longo desses 15 anos?

Miguel - Em primeiro lugar a consagração popular do espetáculo é arrebatadora. A adesão dos artistas da cidade e do país é também emocionante. É singular ver os grupos artísticos da cidade deixarem em suas agendas o Auto como reserva especial a cada Círio. Infelizmente, não cabem todos em uma única edição. Vamos alternando a cada ano. As pessoas criam músicas, coreografias, algumas juntam dinheiro o ano todo para o capricho com o figurino. Alguns grupos de teatro já se formaram dentro do Auto, sem falar nos talentos que o espetáculo revela para a cidade a cada ano. O espetáculo já foi tema de quadrilha, de escola de samba, entre outros. Na academia, o Auto do Círio já foi objeto de pesquisa de TCCs, monografias, pesquisas de Mestrado, além de diversos documentários, vídeos e seminários em muitas instituições de ensino e pesquisa. Essa é a dimensão do teatro de rua como construção de conhecimento e saber que o Auto vem promovendo a cada ano, num movimento importantíssimo para a s artes cênicas brasileiras e a produção amazônica paraense.

Troppo - Como será o espetáculo este ano?

Miguel - Este ano escolhemos como tema 'Por uma Belém de Paz'. Comungando com o público gigantesco, com a arte e com a devoção dos paraenses, vamos fazer um pedido de paz para a nossa querida Belém, tão necessitada nos dias de hoje. Será um espetáculo de muita iluminação, branco, anjos e uma espetacularidade irmanada com e pela paz. Todas as musicas, textos e figurinos terão essa tônica da paz. Serão quinhentos artistas em cena. Costumo dizer que no Auto é um quilometro de extensão e três horas de emoção.

Troppo - Como estão os ensaios?

Miguel - Os ensaios começaram no dia 22 na Praça da Bandeira a partir das 19h todos os dias até o dia do evento. Este é o ensaio aberto para que toda a cidade assista. Estão todos convidados para assistirem o nosso processo criativo. A produção trabalha o ano todo No ICA- Instituto de Ciências das Artes e na Escola de Teatro e Dança para fazer um grande espetáculo.

Troppo - Você acredita que haveria possibilidade de o espetáculo ser encenado em outro bairro da cidade?

Miguel - Nenhuma. A escolha da Cidade Velha é simbólica, espiritual e diria antropológica. Ali começou tudo. A cidade, o Círio, os cortejos, nossas melhores caminhadas herdadas de nossa matriz Lusitana. O Auto e uma jóia rara que nasceu engendrada por tudo isso, nossa melhor festa e ancestralidade!

Troppo - Então, aproveite e faça o convite para o público prestigiar novamente o Auto do Círio este ano

Miguel - No dia 10 de outubro, com saída às 19 horas do Largo do Carmo, teremos o Auto do Círio 2008, com o tema 'Por uma Belém de paz' Se vista de branco e venha se emocionar comungando a arte, a fé e a devoção!


Disponível em

http://www.orm.com.br/oliberal/interna/default.asp?modulo=439&codigo=372119



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